A. F. Monquelat
V. Marcolla
A
VINDA DE JOSÉ E ANTÔNIO PINTO MARTINS PARA O SUL
Quanto
à partida dos irmãos da capitania do Ceará, admite Vieira Jr. que
possa ter “acontecido nos anos 90 do século XVIII”.
Diz-nos,
também, Vieira Jr. que: “E, mesmo considerando as dificuldades de
navegação, José Pinto Martins mantinha um brigue, chamado Conde da
Figueira, que comercializava diretamente com Pernambuco (incluindo
Aracati e Mossoró): o sal era a base do comércio e os contatos de
Antônio em Mossoró podem ter rendido a continuidade desse comércio.
Ou seja, José e Antonio não só partiram do Ceará para o Rio
Grande do Sul, como estabeleceram uma rota comercial entre extremos
da América lusitana. Com o passar dos anos, a empreitada comercial
deu prejuízo, deixando uma dívida significativa no patrimônio de
José Pinto Martins”.
Em
nosso artigo, “Pinto
Martins ou João Cardoso?”,
publicado no Diário da Manhã de 20 de outubro de 2011, p.13,
dissemos a certa altura que: “O primeiro sinal da presença de
Pinto Martins no Continente de São Pedro, nos parece ter sido o por
nós apontado, quando da publicação do artigo ‘Apontamentos
para uma história do charque no Continente de São Pedro’,
de nº 12, onde o encontramos em 1º de outubro de 1796, assinando,
junto a outros moradores do Continente, uma Representação a Sua
Majestade clamando por sal, para que pudessem praticar as suas
charqueações”.
Dissemos
também, no mesmo artigo, que “Durante anos de estafante pesquisa,
não conseguimos encontrar nas mais diversas fontes e arquivos
consultados, o menor indício da presença de José Pinto Martins
entre nós no espaço temporal dos anos de 1780 a 1795; o que, por
outro lado, não significa que aqui não tenha estado; e sim que, até
hoje não existe a menor prova documental de sua presença ou do
estabelecimento de charqueada em 1780, no Continente”.
Uma
outra afirmação feita por nós e no mesmo artigo foi a de que
“Embora não haja prova documental alguma sobre a presença do
charqueador José Pinto Martins nos anos que dizem ter ele instalado
sua charqueada, 1779-1780, vamos admitir que tal tenha ocorrido. Aí,
podemos trabalhar com duas hipóteses: a primeira, é a de que
houvesse se arranchado, por favor ou arrendamento, nas terras do
capitão Inácio Antônio da Silveira (Fazenda do Monte Bonito), e
ali instalado sua charqueada; [...].
Que
José Pinto Martins esteve entre nós, não há dúvida alguma. A
pergunta é: desde quando e onde?”.
Em
trabalho ainda inédito, no capítulo que titulamos de “Pelotas,
terra de esbulhos e querelantes”,
trazemos alguns elementos do processo movido por Mariana Eufrásia da
Silveira contra Gonçalo José de Oliveira, que podem nos indicar
onde pudesse estar José Pinto Martins, na década de 90 do século
XVIII, quando aqui, em Pelotas, se instalou.
Mariana
Eufrásia, através de seu procurador, entrou com pedido de Embargo,
no qual, nos diz esta, que é “viúva do falecido Capitão-mor
Francisco Pires Cazado, que em razão de ter Gonçalo José de
Oliveira casado com uma neta da Suplicante, permitiu a este, que
dentro das terras de que o casal da Suplicante é legítimo possuidor
nas margens do Rio de São Gonçalo, levantasse casa para sua
moradia. E isto, enquanto durasse o favor da Suplicante; porém, este
seu beneficiado, abusando do mesmo bem que se lhe fez, e até
menoscabando o respeito e submissão devida à Suplicante, não só
por ser avó de sua mulher, mas Senhora daquelas terras, projeta, com
a mais espantosa ingratidão, levantar de seu próprio árbitro e de
novo reedificar um Estabelecimento de Charqueada, dentro das terras
da Suplicante, no mesmo lugar, que já noutro tempo foi permitido ao
Suplicado que o fizesse, e que presentemente se acha abandonada e
destruída, por não funcionar há três anos, pouco mais ou menos. E
porque à Suplicante não convém, pela atitude absoluta do
Suplicado, que este reedifique o abandonado estabelecimento de
charqueada, pelo futuro prejuízo e inquietação que pode advir à
Suplicante, como já o tem experimentado. [...]”.
Em
sua defesa, disse Gonçalo José, na Apelação, “que ele era
senhor e possuidor de uma pequena porção de terras dentro dos
Campos de seu sogro, o Capitão Ignacio Antonio da Silveira, e que
essa porção de terras ficava ‘nas margens do Rio São Gonçalo e
o Arroio de Santa Barbará. Acrescentando, que dentro do dito
terreno, há muitos anos têm casas de vivenda, galpões, armazéns,
atafona [Moinho manual ou movido por cavalgaduras], cercados e todo o
necessário à Fábrica de charquear carnes, couros e sebos. Como
também, de uma casa de negócio de fazendas e armazém de
molhados’”.
Na
continuidade da querela judicial, contestou o embargado Gonçalo José
de Oliveira, afirmando que: “[...]. Terceiro: provará que o
Capitão Ignacio Antonio da Silveira, com este legítimo título,
possui e está possuindo as ditas terras do Arroio Santa Bárbara,
margens do Rio de São Gonçalo, há trinta e quatro anos, por sua
própria, Real e corporal posse, sem nunca haver, e ter havido em
todos estes anos, uma só pessoa que lhe contestasse. E por isso, de
paz mansa e pacificamente está possuindo as ditas terras no Arroio
de Santa Bárbara há mais de vinte, trinta, quarenta e mais anos,
por si e seus antepassados possuidores, e nelas sempre o dito Capitão
Ignacio Antonio da Silveira, seu sogro, teve e conservou uma grande
Fábrica de Olaria, onde se fazia toda a qualidade de tijolo e telha.
E também, no mesmo lugar, tinha casas, escravos e criações de toda
a qualidade, como suas, que estão e são as ditas terras, sem que
nelas tenha havido outro mais algum possuidor, como melhor dirão as
testemunhas, que requeiro se escreva tudo o que elas depuserem e
disserem, ainda que articulado não seja. Quarto: provará que quando
o Embargante recebeu do Capitão Ignacio Antonio da Silveira, seu
sogro, aquelas duzentas e cinquenta braças de campo, em Causa Dotis,
no lugar onde se acha estabelecido com casas, armazéns, negócio,
quinta e sua Fábrica de Charquear, já em todo o Arroio de Santa
Bárbara se achavam estabelecidos outros muitos e diversos moradores
com negócios mercantis, Fábricas de Charquear, casas de residência
e armazéns necessários para recolher os necessários mantimentos,
que se exportam para o Rio de Janeiro e mais portos; cujos
estabelecimentos foram ali feitos e formados há muitos anos, com
licença, concessão e faculdade do sobredito Capitão Ignacio
Antonio da Silveira, aonde, ainda hoje, existem os mesmos moradores,
com grandes Fábricas e importantíssimas propriedades de Casas,
Seleiros [Fabricante ou vendedor de selas] e Armazéns, com grande
giro de Comércio, do qual dão grandes e avantajados interesses a
Sua Alteza Real, com os muitos Direitos que lhe pagam. [...]”.
Eis
aí onde possivelmente estivesse José Pinto Martins e sua primeira
“Fábrica de Charquear”, ou seja, em terras do Capitão Inácio
Antônio da Silveira e na margem do Arroio Santa Bárbara.
Concluindo
e pondo um ponto final na questão de ter ou não José Pinto
Martins, em 1780, instalado uma charqueada na margem direita do
Arroio Pelotas, dizemos que: José Pinto Martins não estava ou
esteve em Pelotas nessa época.
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Nota:
Os documentos transcritos são paleografados e ortograficamente
atualizados pelos autores.
* Artigo publicado no Jornal Diário da Manhã, no dia 08 de janeiro de 2012.
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