A. F. Monquelat
V. Marcolla
A
história das terras que deram origem à charqueada do Serro Pelado
teve seu início com a petição do padre João de Castro Ramalho.
Neste
documento disse o Padre que de acordo com o Edital mandado publicar
pelo governador José Marcelino, em 1º de janeiro de 1780, se
mandava repartir as terras, dentro da divisão meridional deste
Continente, “e os que tiverem documentos ou serviços prestados a
Sua Majestade, que o disponham para terem a preferência dentre os
demais”; o que levou o Padre a dizer que os serviços que “tem
feito a Sua Majestade é o de ter servido no ofício de Capelão, no
Regimento de Extremos, por tempo de dez anos, como consta dos
documentos que junto oferece”; e, que isto o levava a pretender “um
terreno devoluto, que faz frente pelo Leste, com o Serro Pelado; pelo
Sul e Sudoeste, com José de Azevedo e o tenente-coronel João de
Azevedo, fazendo fundos para o Oeste; e, pela maior parte, se dividem
com a Serra. [E que], para povoar a dita Sesmaria ou terras, declara
ter tudo o que é preciso para dar princípio [...]”.
Atendendo
ao requerimento do padre João de Castro Ramalho, pediu o Brigadeiro
Governador o “Informe o Senhor Coronel Rafael Pinto Bandeira,
ouvindo o Capitão de Dragões, Manoel Marques de Souza. Vila de São
Pedro, 10 de outubro de 1780 [Rubrica]”.
Rafael
Pinto Bandeira, por sua vez, pediu em 23 de outubro do mesmo ano, que
Manoel Marques de Souza se manifestasse com relação ao pretendido.
Aos
25 de novembro de 1780, informou Marques de Souza que o terreno
pedido pelo “Reverendo Suplicante, está devoluto [e ele], tem
meios para o cultivar e é merecedor ser atendido”.
Aos
27 dias de novembro de 1780, o Governador concedeu ao Padre “três
léguas de comprido e uma de largo, no terreno que aponta”; com a
ressalva de que “só terá vigor não se apresentando outro
Sesmeiro com documento mais antigo; e, ficando obrigado a requerer
tal terreno na forma das Reais Ordens”.
Não
aparecendo documento mais antigo, ficou o padre João de Castro
Ramalho de posse das terras até 8 de fevereiro de 1782, quando,
então, declarou no próprio título que: “Pertencem as terras de
que trata este título, a meu irmão Gaspar de Araújo Castro
Ramalho, por delas lhe ter feito doação. Rio Grande [...]”. Logo
após, consta a assinatura do Padre.
GASPAR
DE ARAÚJO CASTRO RAMALHO VENDE, NO RIO DE JANEIRO, A SESMARIA QUE
LHE FORA DOADA
Aos
cinco dias do mês de julho do ano de 1785, Gaspar de Araújo Castro
Ramalho e sua mulher, Joana Maria Cordeiro, comparecem em “casas de
morada de mim Tabelião adiante nomeado, nesta cidade de São
Sebastião do Rio de Janeiro, de uma banda, como vendedores moradores
nesta cidade; e, de outra, como comprador, Joaquim José da Silva,
procurador bastante, que mostrou ser de José Roiz da Fonseca, por
procuração feita nesta nota por mim Tabelião, em 21 de janeiro de
1780, […]. Logo pelos ditos vendedores, […], perante as mesmas
testemunhas; que eles são donos de uma estância sita no Continente
do Rio Grande, que consta a mesma de três léguas de comprido e uma
de largo, que faz frente para Leste no Serro Pelado […] e disse o
dito vendedor, que não apresentava o título da dita doação, por
se achar em poder do comprador José Rodrigues da Fonseca, que se
acha no Continente […] por preço e quantia de cento e setenta e
nove mil e duzentos réis, que confirmam ter recebido da mão do
comprador, em dinheiro de contado, moeda corrente neste estado, que
eu Tabelião dou fé, assino e declaro […]. Tabelião Ignacio
Teixeira de Carvalho, que o escrevi. [...]”.
Não
muito tempo depois, José Rodrigues da Fonseca, morador no Continente
do Rio Grande, através de requerimento encaminhado ao Vice-rei, diz
que “possui uns campos por compra que deles fez a Gaspar Dutra
Castro Ramalho, como consta da Escritura junta”, dizia ainda que
possuía “escravos e avultado número de animais vacuns e
cavalares, que já tem em dito campo”, o qual, terá pouco mais ou
menos três léguas de comprido e uma de largo, fazendo frente no
Serro Pelado; e, pelo Sudoeste, parte com José de Azevedo e o
tenente-coronel João de Azevedo; fazendo fundos para Oeste; e, pela
outra, se dividem com a Serra [...]”.
O
requerimento de José Rodrigues da Fonseca teve, por parte do
Vice-rei, o seguinte despacho, em 28 de agosto de 1786: “Informe a
Câmara e o Provedor da Fazenda”.
Não
conseguimos paleografar, por excesso de tinta, o parecer do Provedor
da Fazenda Real; quanto ao da Câmara, foi dito que “As terras que
o Suplicante pede, consta-nos que as está possuindo, sem embaraço,
para que deixe de conseguir a graça que pretende: V. Exª. mandará
o que for servido. Porto Alegre, em Câmara de 25 de novembro de
1786. Antônio José Alencastro; Antônio José de Farias; Antônio
Pereira Fernandes; Antônio Rodrigues da Silva e José Roiz de
Figueiredo.
Em
virtude dos pareceres, recebeu o “Passe Carta na forma das Ordens.
Rio, 11 de junho de 1787. [Rubrica]”.
A
CHARQUEADA DO SERRO PELADO
Não
conseguindo mandar medir e demarcar as terras, exigência para que
recebesse sua Carta de Confirmação, volta José Rodrigues da
Fonseca a peticionar, dizendo ser “morador estabelecido no
Continente do Rio Grande de São Pedro do Sul, com fazenda de
agricultura e criação de gado vacum e cavalar, que
charqueia aquele, dirigindo
[enviando] avultadíssimas
porções a este país, com que o abunda
[ilegível] daquele
gênero; fazendo deste, grandes manadas,
cuja tropa também vende para diversas partes, interessando [causando
lucro] ao Régio Patrimônio com os grandes Direitos que paga.
[grifos nossos].
E
como, Real Senhor, a dita fazenda é formada em terras que o
Suplicante possui e tem cultivado naquele vastíssimo Continente, e
lhe foram concedidas por Sesmaria, como se infere da respectiva Carta
inclusa, a qual, mandando o Suplicante pela 1ª via a confirmar,
ainda não voltou; ou por omissão dos procuradores, a quem foi
incumbido o particular ou pelas circunstâncias ocorrentes; e, porque
o Suplicante deseja titular-se legitimamente nas ditas terras, onde
se acha estabelecido e tem cultivado: Suplico a V. A. Real para que
se digne fazer a graça de lhe mandar confirmar a dita Sesmaria,
dispensando-o do lapso de tempo, cujos respectivos direitos, não
duvida solver [pagar]. Pede [...]”.
Os
Despachos
Haja
vista o Procurador da Coroa e Fazenda. Rio, em Mesa de 19 de janeiro
de 1809 (Rubrica).
O
Procurador
Deve apresentar a
medição e demarcação judicial desta Sesmaria. Rio, 19 de janeiro
de 1809. (Rubrica).
A Provisão de
Lapso de Tempo
Aos 19 dias do mês
de janeiro de 1809, o Conde de Aguiar, em nome do “Príncipe
Regente [...], há por bem dispensar para que, sem embargo do lapso
de tempo, se passe confirmação da Carta de Sesmaria inclusa, que em
30 de junho de 1787 se passou a favor de José Rodrigues da Fonseca:
o que V. Exª. fará presente na Mesa do Desembargo do Paço, para
que assim se execute”.
A Mesa
Satisfaça. Rio, em
Mesa de 26 de janeiro de 1809. (Rubricas).
Encontrando novas
dificuldades de cumprir as formalidades exigidas, volta José
Rodrigues da Fonseca a peticionar a Sua Alteza Real, informando que,
sendo-lhe concedida a Carta de Sesmaria, e pretendendo confirmá-la,
requereu “o Suplicante a V. A. Real, por segunda via; e, porque se
mandou, por despacho do Procurador da Coroa, juntar a medição das
mesmas terras; e, como não tem o Suplicante feito medir, pelo grande
respeito que gozam os confrontantes, que obtém dos Juízes das
Medições a não medição da Sesmaria do Suplicante; e que, para
poder Conferir o referido despacho, requer, por isso a V. Majestade
se sirva de mandar passar Provisão dirigida aos Juízes daquele
Continente do Rio Grande, para que os mesmos, em tempo breve e logo
que esta lhes seja apresentada, façam a medição e demarcação da
Sesmaria do Suplicante; e não o fazendo, quando apresentada o for,
se haja a culpa [...]”.
O pedido foi
atendido aos 6 dias do mês de março de 1809, com o “Passe
Provisão. [Rubrica]”.
É lamentável, por
falta de documentos, não termos apurado maiores detalhes sobre a
Charqueada do Serro Pelado.
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* Artigo publicado no Jornal Diário da Manhã, no dia 11 de setembro de 2011.
Nota:
Os documentos transcritos foram atualizados e paleografados pelos
autores.
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