sábado, 29 de janeiro de 2011

APONTAMENTOS PARA UMA HISTÓRIA DO CHARQUE NO CONTINENTE DE SÃO PEDRO (24)*


A. F. Monquelat
V. Marcolla

O estabelecimento dos irmãos Almeida e seus sócios chega ao Continente de São Pedro, trazendo irlandeses e suas técnicas na salga de carnes

Minuta do que importa a isenção dos direitos (taxas e impostos), que requerem nos seguintes gêneros, por ano. A saber:

10.000 arcos de ferro de entrada, cada um 30 réis ..................................................................................... 300$000
2.000 moios de sal, que antes do novo Alvará, que extinguiu este Contrato, era livre de direitos  e permitido a qualquer um importá-lo para o Rio Grande e, hoje, paga de direitos por moio 1.600 réis ......................................................... 3.200$000
O 5º [quinto] dos 10.000 couros no Rio Grande, que são 2.$000 cada um a 700 réis ................................................... 1.400$000
As 40 arrobas de salitre, entrada e saída ..................... 30$000
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Réis: 4.980$000

Ass: Joaquim Pereira de Almeida & Companhia
Recebido: Manoel Joaquim de Oliveira Lage

O parecer de D. Luiz de Vasconcelos e Souza, encaminhado ao Visconde de Anadia

Foi o Príncipe Regente, Nosso Senhor, servido por Aviso, que V. Exª. me dirigiu em data de 29 de outubro próximo passado, Ordenar que eu interponha o meu parecer sobre a matéria da inclusa consulta da Junta da Fazenda da Marinha, em Requerimento de Joaquim Pereira de Almeida & Companhia, os quais representam que, tendo formado um dispendioso Estabelecimento de salga de carnes no Rio Grande de São Pedro, necessitam, para conservação dele, que Sua Alteza Real o proteja pela maneira que propõem, e consiste, em suma, contratarem com a Fazenda Real, o consumo certo e anual, para uso da Armada, de 2.500 barris de carne salgada a preço de 11.$000 réis cada barril, posto em Lisboa; e a 9$000 réis no Rio de Janeiro, com as isenções de direitos de vários gêneros que importarem em 44.820$000 réis, recebendo, em pagamento, metade em pólvora e a outra metade em cabos da Real Cordoaria, pelo preço que estes gêneros correrem.
Acho que é de toda a razão, e de grande interesse para o Estado, animar um Estabelecimento Colonial, que pode evitar a importação, até agora necessária, de carnes de países estrangeiros; mas, é preciso, quando se trata de favorecer este, e quaisquer outros Estabelecimentos pessoais, por mais úteis que sejam, não o fazerem com sacrifícios e despesas avultadas, ainda, quando a Fazenda Real, estivesse em estado de poder com elas: no caso contrário, sobre serem injustos, são de muito mais consequências para a prosperidade geral, e para o bom equilíbrio da indústria e riqueza nacional, todos e quaisquer favores que são concedidos a algum indivíduo ou Companhia particular, uma vez que há expressa e convencionada exclusão de outros indivíduos ou Companhias.
Toda a isenção de direitos, assim como todo o aumento de preço concedido pela Fazenda Real, sobre qualquer gênero particular, animará, sem dúvida, a sua fabricação; porém, certamente, certos sacrifícios feitos a favor de um particular indivíduo ou Companhia, devem incorrer na censura de prodigalidade; e, unicamente, podem ser acertados, quando o interesse de tais estabelecimentos vier aumentar o rendimento dos Cofres Reais. Se as isenções de direitos, que requerem os pretendentes, e se o preço, que também exigem, é tal, que o prejuízo da Fazenda Real é pequeno, a vantagem não pode bastar para sustentar um estabelecimento, que eles dizem não poder subsistir sem este auxílio; e, se é grande, como de fato acontece, pois só a isenção de direitos importa em 112 mil cruzados, é comprar cara a glória de ter um estabelecimento, que não pode subsistir sem isso; e só desculpável, quando há certeza que os interesses hajam de vir a ser da Fazenda Real, e não de um particular; e além disto, animar tão generosamente aquela salga de carnes, pode vir a desanimar quaisquer outras que se podem estabelecer em qualquer outra Colônia, e mesmo no Reino, especialmente no Algarves, onde é fácil importar de Barberia [?], vivas, pelos preços mais cômodos, muito grande número de reses, que depois de gordas, com prados naturais, ou artificiais, se podem ali salgar e vender por menores preços do que as carnes da Irlanda.
Se os pretendentes requeressem, que se lhes fizessem algumas encomendas de carnes salgadas, e que, depois de se reconhecer, que estas são de tão boa qualidade e duração como as da Irlanda, fossem sempre preferidas às de fora, por preços iguais, ou ainda maiores, teria tal pretensão, toda a aparência de justiça, e desta mesma opinião, é o Intendente da Marinha, na sua informação, pelo que se acha acertado, que se lhes encomendassem, primeiramente, só 1.000 barris, pelo oferecido preço de 11$000 réis, no que também concordo. E, a este parecer, em substância, se encosta (aproxima) a Junta. Esta, porém, acha que depois se pode vir a admitir o Contrato, por tempo de 9 anos, no que não vejo interesse algum para a Real Fazenda, antes, prejuízo a risco, assim porque, o consumo da carne salgada não pode ser avaliado ao certo cada ano, dependendo das embarcações, que, por muito variáveis circunstâncias, podem necessitar se armar, ou desarmar; como por dever se recear, que, deste modo, seja mal provida a Marinha; nem vejo necessidade de tal convenção para se sustentar o Estabelecimento; e só, sim, uma exclusão, ou um encontro prejudicialíssimo a outros especuladores, ou estabelecimentos desta natureza.
A forma de pagamento, que exigem, é justa e útil à Fazenda, posto que não de tantas vantagens, quanto poderão parecer, porquanto a pólvora e cabos têm constantemente muito boa venda, sem que necessitem a certa saída, com que estes Negociantes convidam a adotar o seu projeto; e por consequência, vem a ser quase o mesmo que pagar com estes gêneros, ou com dinheiro, uma vez que seja sempre com os largos prazos, que são propostos pela Junta.
É quanto me permite dizer a brevidade do tempo, que posso, escassamente tirar para este, e para outros muito negócios, com o fim de satisfazer às Reais Ordens, que V. Exª. me participa.
Deus guarde a V. Exª. Lisboa, em 15 de novembro de 1805.

Continua...

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Nota: Os documentos transcritos são paleografados e ortograficamente atualizados pelos autores.
Artigo publicado no Jornal Diário da Manhã, no dia 30 de janeiro de 2011.

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