domingo, 12 de dezembro de 2010

APONTAMENTOS PARA UMA HISTÓRIA DO CHARQUE NO CONTINENTE DE SÃO PEDRO (17)*




A. F. Monquelat
V. Marcolla

Por ordem de Sua Majestade, é abolido o monopólio do sal no Brasil

Informado por Ofício de 4 de maio de 1795, no qual o secretário de estado dos Negócios Estrangeiros da Guerra e interino da Marinha e Ultramar, Luiz Pinto de Souza Coutinho, dizia que por Ordem de Sua Majestade, convencida de que os atrasos do Estado do Brasil e suas Colônias não fora outro se não a ocorrência de pesados monopólios exercidos na série de longos anos, tanto no do sal, como nos direitos impostos sobre o ferro e a introdução de escravos, além de outras restrições fiscais, ficava abolido o Contrato do Sal, de forma que ficavam livres todas as Salinas que se pudessem estabelecer na Capitania do Rio de Janeiro, delas podendo todos os colonos usufruir e beneficiar; no entanto, tal determinação deveria ser compensada por um aumento dos impostos sobre os mesmos gêneros, a título de ressarcimento em prol do Real Erário.
Em face de tal Ofício, tratou o Vice-rei de comunicar ao secretário de Estado do Conselho, conforme correspondência de 31 de outubro do mesmo ano, que no cumprimento das Ordens de Sua Majestade, havia tomado algumas providências, e, dentre elas, o ouvir e acertar com as Câmaras a melhor forma de aplicarem e se adequarem às novas medidas.
No que tangia ao novo imposto sobre o sal, deliberaram, “depois de terem calculado miudamente este importante artigo, por partes integrais, estabelecendo um termo médio, por não haver um mais exato que servisse de combinação, respectiva à certeza física de números de alqueires de sal, que anualmente nesta Capitania do Rio de Janeiro, seus termos e outras correspondentes se consome, acertaram, de comum acordo, que se determinasse, em cada alqueire de sal proveniente de Portugal, a imposição de 80 réis, para que deste modo ficasse indenizado o donativo que o Contratador pagava a Sua Majestade; além de outra igual quantia, que naquela cidade deveria ser paga no Real Erário, sendo porém o referido donativo pago por entrada, e cobrado da mesma forma que se cobrava os donativos das demais fazendas. E que as Salinas do Brasil, ou beneficiadas ou já existentes, ou novamente estabelecidas e aumentadas pagassem somente 80 réis da nova imposição, por alqueire, livre de dízima, dízimos ou algum outro direito.
Acertaram, também, que para aquele fim seriam sempre tombadas as novas Salinas antes da extração do sal, avaliadas por pessoas peritas e juramentadas pelas Câmaras a que pertencessem, para que nas mesmas Fábricas se cobrasse a imposição arbitrada por alqueire, na conformidade da medida do País. E que depois de satisfeita a imposição que viesse a caber sobre a respectiva Salina, pudesse ser transportado o sal para qualquer parte, levando Guia onde constasse que pagara o Direito estipulado; suplicavam ao mesmo tempo a S. Majestade, a faculdade e liberdade dos chãos das Marinhas, onde as Salinas estivessem ou se criassem, em benefício dos donos das terras em cujas confrontações ou testadas ficassem, recorrendo os fabricantes às Câmaras competentes, licença para o estabelecimento e tombo [registro] das suas Salinas, o que mais claramente se manifesta nos documentos apontados e seguidos do número 1º até o 4º”, (os documentos mencionados pelo Vice-rei não estavam anexados ao Ofício).
As constantes súplicas e reivindicações feitas devido à falta de sal no Estado do Brasil levaram o secretário de estado da Marinha e Ultramar, Dom Rodrigo de Souza Coutinho, a pressionar o Contratador do gênero, Joaquim Pedro Quintela & Companhia, no sentido de resolver o problema, enviando sal para o Brasil.
Tratou logo o Contratador de, aos 29 dias do mês de agosto de 1798, explicar ao Secretário os motivos do atraso e as providências que tomara para resolver o assunto comunicando que, atendendo a respeitável Ordem de S. Majestade, no sentido de que fosse enviado para o Brasil o maior número possível de embarcações com sal, já estavam estas por sair. Disse, ainda, que a atitude do Vice-rei foi muito acertada e justa em ter determinado mandar beneficiar a cultura do sal nas Salinas de Cabo Frio, visto que, “deste gênero de tanta necessidade experimenta grande penúria todo o Brasil, por causa da Guerra, e não por culpa ou omissão dos Contratadores, os quais, na maior exportação e venda do sal, têm o seu negócio”.
Justificou, também, o Contratador, dizendo que ele e seus sócios, pela falta de navios, não conseguiram embarcar a quantidade de sal que desejavam, e que por isto já tinham dado ordens a todos os Administradores do Contrato daquele Continente [do Brasil], no sentido de que se alguns particulares quisessem estabelecer novas Salinas ou engrandecer as antigas, havendo o beneplácito dos Governos, não lhes fosse feito embaraço algum; e isto, era tudo o que podiam determinar, pois mais do que isto fosse uma contravenção ao Contrato.
Os Contratadores encerravam o documento dizendo que os comboios, que de Lisboa partiram em janeiro e maio do mesmo ano, carregando todo o sal possível e acima das lotações que os navios eram obrigados a transportar, por desgraça haviam caído nas mãos dos franceses, inclusive o Fossa Lamas, que ia em direção ao Rio de Janeiro. Porém, apesar de todo o infortúnio, estavam despachando para o Rio de Janeiro a galera Águia da América, que por causa da sua fraca construção carregava tão somente 120 moios de sal; e que para os demais portos do Brasil, no mesmo comboio, estavam preparando as maiores quantidades possíveis de serem transportadas pelos navios; e esperavam também, a curto prazo, sendo bem sucedidos, enviar um grande número de navios carregados de sal.
Dias depois (12.09.1798), voltaram os Contratadores a comunicarem ao Secretário, que dando cumprimento ao Aviso de 6 de setembro, mandado expedir por Sua Alteza Real, eles haviam decidido, pelos meios mais próprios e rápidos, fazerem envio de maiores remessas de sal para o Rio de Janeiro e que tal até então não havia ocorrido, pelo fato dos proprietários e mestres de navios de frete preferirem cargas para os portos da Bahia e Pernambuco.
Em função desta preferência, tinham feito várias diligências para comprar alguns navios; mas, com muito custo, só haviam conseguido comprar um único navio. Um navio americano, denominado de Ana Catarina, e que o mesmo já se encontrava pronto para seguir viagem naquela mesma semana, carregando 600 moios de sal. E, graças à proteção do Secretário, tinham conseguido que o negociante João Pereira Caldas, mudasse o destino das viagens que projetava fazer para a Bahia e Pernambuco com os navios Fênix e Santa Cruz, dos quais era proprietário, e os enviasse para o Rio de Janeiro, carregando, entre ambos, 1.000 moios de sal.
Disseram, também, que já haviam dado ordens aos correspondentes em Setúbal e Porto para que diligenciassem o fretamento ou, se lhes fosse possível, comprassem alguns iates próprios para semelhante expedição.
Encerravam comunicando que graças ao bom êxito da expedição anterior ao Brasil, os navios Diana e Jacaré, dos quais eram proprietários, tão logo descarregassem, os fariam aprontar; e cada um carregaria o maior volume de sal que pudesse, para partirem em comboio, com destino ao Rio de Janeiro e que, à vista de suas extraordinárias diligências, “conhecerá V. Exª., qual seja o desejo de cumprirmos exatamente com os nossos deveres, e com as determinações de Sua Majestade”.

Continua...

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Nota: Os documentos transcritos são paleografados e ortograficamente atualizados pelos autores.
Artigo publicado no Jornal Diário da Manhã, no dia 05 de dezembro de 2010.

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