domingo, 7 de novembro de 2010

APONTAMENTOS PARA UMA HISTÓRIA DO CHARQUE NO CONTINENTE DE SÃO PEDRO (13)*



A. F. Monquelat
V. Marcolla

O Conde de Rezende, Alexandre Inácio da Silveira e as Salinas de Cabo Frio


Retornando ao palco um dos nossos principais personagens, Alexandre Inácio da Silveira, um nome a quem o charque e o Continente de São Pedro devem, e muito da sua história no primeiro período (1780-1800), vamos encontrá-lo, ou pelo menos o rastro dele, desta vez em Cabo Frio, distrito do Rio de Janeiro; sendo que agora, quem dele nos dá notícias é o conde de Rezende através do Ofício dirigido ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, D. Rodrigo de Souza Coutinho, aos vinte e oito dias do mês de abril de 1798.
Em tal ofício, o vice-rei do Estado do Brasil, D. José Luís de Castro, conde de Rezende, informa que em Ofício de 31 de outubro, respondendo ao Sr. Luiz Pinto de Souza sobre o Aviso de 7 de maio do mesmo ano, em que era comunicado sobre as medidas que Sua Majestade se dignava tomar em benefício deste vastíssimo Estado e suas Colônias, persuadida de que os seus atrasos não tiveram outra origem do que o concurso de pesados monopólios, exercidos na série de dilatados anos, assim como o do sal, o dos direitos do ferro e o da introdução de escravos, além de outras restrições fiscais, não menos prejudiciais ao interesse comum. E sendo a mesma Senhora, servida de ordenar, no citado Ofício, que logo se fizesse abolir o Contrato do primeiro gênero (o sal), e ficassem livres todas as Salinas que se pudessem estabelecer nesta Capitania, em benefício dos Colonos; substituindo-se, em benefício desta franqueza e benefício, uma leve imposição neste ou em outro qualquer gênero, por cujo meio ficasse ressarcido o Real Erário.
Tratando inicialmente do primeiro Artigo, disse o conde de Rezende, que, no seu sobredito Ofício, havia dado parte de ter convocado as Câmaras para ouvi-las. E, na conformidade dos seus pareceres, assentar naquilo que fosse mais conveniente ao serviço de Sua Majestade e ao bem público. E, a partir de suas respostas sobre aquele e outros artigos, com todas as demais diligências feitas em um negócio tão sério, se persuadiu de que, chegando a Real presença de Sua Majestade, desse início naquele incomparável benefício prometido aos habitantes da Capitania; mas, ignorando os motivos do atraso experimentado, servia-se daquele princípio para justificar a deliberação que acabara de tomar.
Em seguida, diz o Conde que chegando àquela Cidade Alexandre Inácio da Silveira, encarregado pela Corte de fazer algumas remessas de carnes do Rio Grande de São Pedro, com amostras de carnes, salgadas com diferentes sais, e tendo recebido alguma porção na Bahia e outra em Pernambuco, vindas do mesmo Rio Grande, pretendeu “o meu favor, para o bom êxito da sua missão”, no sentido de promover as Salinas de Cabo Frio; pois, com aquele socorro, poderia satisfazer as diligências em que estava empenhado com a Corte.
Tendo o Conde percebido, por um lado, a importância de um negócio tão recomendado pela Corte; e por outro, a conveniência que resultaria aos moradores de Cabo Frio, caso fosse estimulada a produção de sal, na qual, entendia o Conde, tivessem eles inegável direito, por isso, empenhou-se o quanto pode para que não frustrasse uma missão tão importante.
Porém, informa o Conde, que tendo desaparecido “aquele homem”, (Alexandre Inácio), sem lhe participar os resultados que havia obtido nas Salinas, considerou a cultura do sal na mesma inércia em que se encontrava, e também no mesmo estado se conservavam as medidas tomadas para o estabelecimento das Salinas em geral, até que começaram a sentir naquela Capitania, e, por consequência, em todas as outras confinantes, “uma carestia de Sal; ou seja, pelas módicas remessas, que dessa Corte o Contratador tem feito, ou seja pela falta de embarcações para o transporte; ou, finalmente, por não terem chegado a esta Cidade alguns navios em que venha maior abundância, como dizem ser o Fossa Lamas, cujo destino até o presente se ignora”.
Por todos aqueles motivos, deixava ele à consideração do Secretário, a avaliação dos gravíssimos danos que padeciam todos os povos, em virtude de “uma falta tão sensível”; não só pelo que diz respeito ao alimento e ao Comércio, mas também à produção e sobrevivência dos gados, pois que sem uma ração de sal não os podiam manter, principalmente nos lugares distantes da costa do mar.
Acrescentou, ainda, que os clamores ouvidos em todas as partes, somados ao receio de que no futuro se fizesse presente uma maior necessidade; ou que, por algum outro acontecimento interrompesse “o giro do atual comércio, o que talvez obrigue providências que, por não serem tomadas com antecipação, não remedeiem os danos já experimentados”.
Diante disso, disse ter se visto na necessidade de mandar cuidar da cultura do sal em Cabo Frio, escrevendo à Câmara e ao Coronel de Milícias daquele Distrito, para que, de comum acordo, convidassem os habitantes a beneficiarem as Salinas, esperançados na extração do que deveria ser um gênero de suma necessidade.
Ao mesmo Distrito, disse ter enviado dois Oficiais de conhecida capacidade e inteligência, sendo um para tratar das Salinas e distribuição do terreno; e outro, para executar tudo o que lhe havia sido ordenado àquele respeito. E que para tal, empregassem todo o tempo que se fizesse necessário ao que tinham ido fazer naquele lugar.
Entendia o Conde que aquele projeto, cuja finalidade era socorrer todas as Capitanias caso o sal viesse a ser extraído em abundância e continuassem a falta das remessas do Contrato, não só deveriam justificar ao Secretário, considerando as razões da gravíssima necessidade e possível ruína dos povos, mas atenderia a exposição feita no início de seu ofício quanto às medidas que já estavam tomadas na Real consideração de Sua Majestade para mandar abolir o Contrato do Sal, e permitir que Alexandre Inácio da Silveira fizesse experiências nas diversas Salinas do país; pois de tais disposições, ficava-lhe lugar para inferir que não seria contra as “pias intenções da mesma Senhora”, que se pusesse em prática uma providência que viesse a atalhar grandes males, sem levar em conta aqueles que o levavam a pensar na abolição do Contrato e o que viria a acontecer se não houvesse uma abundância de sal no país, que correspondesse ao grande e atual consumo, no ato da extinção do Contrato.
Esperando “que V. Exª., persuadido das minhas intenções, as faça chegar a Real presença de Sua Majestade, para que mereça aprovação a minha interina providência, e que sirva de ocasião para se pôr em execução o que se tem premeditado sobre este objeto”.

Continua...

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Nota: Os documentos transcritos são paleografados e ortograficamente atualizados pelos autores.
Artigo publicado no Jornal Diário da Manhã, no dia 07 de novembro de 2010.

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